Sinto Falta

Não me estou a sentir bem.
E não, não estou a falar nem duma simples indisposição nem duma outra maleita qualquer. O que se passa, na verdade, é que já não me sinto como deve ser. Perdi o rasto de quem já fui e de quem ambicionava ser. Deixei de me sentir com o coração e desprendi-me da intuição. Viciei-me na lógica e estou agarrado ao racional. Não vivo como um, eu sou mesmo um autêntico robô! Segui receitas de pratos que não gostava e, mesmo não tendo todos os ingredientes necessários, confecionei este presente que de prenda tem tão pouco. Para quê? Isto nem é meu. Isto nem sou eu.
Sinto a minha falta.
Sonhava em ser rebelde. Queria ser alguém capaz de pôr de lado tudo aquilo que lhe fosse imposto contra a sua vontade. Se bem me lembro, viver segundo aquilo em que acreditava era o meu propósito. Parecia tão óbvio, tão “tem de ser assim”! Gostava mesmo de mim naquela altura. Cheio de tudo o que importa: sonhos, fé e atitude. No entanto, hoje vejo obediência cega no lugar da rebeldia consciente. Colho apatia desgastada onde pensava ter plantado entusiasmo genuíno. Transbordo restos de desinteresse apesar de ter-me enchido de incessante curiosidade. Desculpem-me, mas não consigo entender. Onde é que me perdi de mim?
Ao menos podia ter-me despedido como deve ser. Dizer um último adeus, acenar com um lenço branco ou qualquer outra coisa do género. Em vez disso, fugi na direcção oposta e já não fui a tempo. Fugi porque toda a gente foge e ainda não voltei porque são poucos aqueles que conseguem voltar.
Gostava mesmo de tornar a ver-me. Rever os meus sonhos e abraçar tudo o que ficou para trás. Desculpar-me pelo transtorno causado, sorrir e seguir-me sem hesitar.

desabafo:

tenho tantas saudades
minhas.

Vasto

Os dias amanhecem e anoitecem, passam. Eu acordo e adormeço, porém fico. Livre de movimentos, mas preso à falta de muros para saltar. Permaneço amarrado a sítios escuros. A sua ausência de iluminação deve-se a uma única e simples razão: não existem. O passado e o futuro são locais explicitamente intocáveis e interditos. Enquanto isso, a luz ao fundo do presente não me ilumina, encadeia-me. O “porquê eu?” é contínuo e incessante, não o consigo largar. Insisto em direcionar esta derradeira pergunta a todos os interlocutores com excepção do único que sabe a resposta – Eu.

Vou tropeçando por entre os corpos de quem já fui. São inúmeras as carcaças vazias d’alma, mas com sentido de missão cumprida. Elas são a prova de que nem sempre aquilo que queremos será eternamente o melhor para nós. O cenário é de guerra, a ferro e fogo. Insisto em pedir socorro, mas só eu posso salvar-me. Vagueio por mim e nem sempre fico agradado com aquilo que contemplo. Tento fechar os olhos para não ver esquecendo-me que o coração nunca hesita em observar. Gostava de nunca desprezar o facto de que, mesmo nos dias mais nublados, o sol nunca desiste de brilhar. Sim, um dia hei-de ser sol e nascer todos os dias com vontade de brilhar.

As minhas emoções têm sido como bolas debaixo de água. Assim que paro de tentar escondê-las, vêm a uma velocidade inigualável à superfície. Sempre que não escolhi magoar e magoei, foi aí que me doeu de verdade. A minha intuição é implacável, nos momentos em que trilha caminhos de dor não me deixa fugir. Vale tudo, mesmo.

Gostava de ser como a borboleta. Não contar meses, mas sim momentos. E, ainda assim, ter tempo que chegue. Quero voar pelo meio da minha confusão e saber que o meu bater de asas nem sempre deixa apenas ar para trás.

 

A ver se não me esqueço:

O caos

repõe o equilíbrio

Amanda

Amanda, meu amor (para perto de mim)

Ainda bem que decidiste aparecer, era mesmo sobre ti que queria escrever. Liberto estes rastos de palavras bem juntos para que não tenhas a mínima hipótese de te esconder entre eles. Sempre foste uma rapariga esquiva com um olhar enternecedor. Do que esperas para te ofereceres ao mundo? Gosto de acreditar que foste feita para aparecer e ser, por isso não te contentes em somente parecer. Para seres mais do que já és, precisas de espreitar o chão. Não te pré-ocupes com a queda, o mais importante é aquilo em que vais acreditar enquanto estiveres desfalecida no solo. Aproveita para te redescobrires e, de seguida, ergueres-te na tua fragilidade e seguires-te. Por favor, persegue a tua intuição Amanda. No momento em que as dúvidas tentarem ofuscar-te, não te esqueças que são nos caminhos estreitos que, por vezes, se escondem as amplas alamedas. Atira a tua alma para perto e mantém-te longe do que não é teu. E quando sentires, vai. A mando de quem? De ti, meu bem. No dia em que o sol decidir regressar Amanda, faz-me o favor de não rasgares a manta que sempre escondeu a tua alma das frias incertezas.

p.s – foi bom enquanto demorou

o teu beijo.